Em 28 de fevereiro, o Dia Internacional de Combate às Lesões por Esforços Repetitivos (LER) / Distúrbios Osteomusculares Relacionados do Trabalho (Dort) busca chamar atenção para a necessidade de prevenção. Para refletir sobre o tema, a Fundacentro realizou a live “LAB TALK [#3] – LER/Dort e os impactos do teletrabalho na pandemia” em 18 de março. Especialistas buscaram discutir o processo rápido de adaptação ao teletrabalho, exigido pela pandemia de Covid-19, e como isso impacta fisicamente e psiquicamente os trabalhadores.

“As LER/Dort abrangem um grupo de doenças que não está relacionado só a questões físicas, é um tema complexo e multifatorial”, afirma a diretora de Pesquisa Aplicada da Fundacentro, Erika Benevides. “Como as pessoas puderam se adaptar ao teletrabalho? Nós sabemos que o trabalho deve ser adaptado à pessoa. Mas, no home office, temos um ambiente não preparado para o trabalho, que não traz condições ideais”, completa.  Essas questões deram o pontapé inicial ao debate, que trouxe olhares multiprofissionais.

A psicóloga e tecnologista da Fundacentro, Laura Nogueira, destacou que há uma associação da questão física com os aspectos psicológicos nos quadros de LER/Dort. Com a pandemia, as pessoas foram demandadas a se adaptar à nova realidade de teletrabalho e a lidar com uma intensificação do trabalho, especialmente, as mulheres, que acumularam outras atividades como os cuidados com filhos e com a casa.

“Não temos como não pensar numa sobrecarga, que pode gerar desvio de atenção, irritabilidade, quadros de ansiedade, entre outros. A gestão perde controle sobre os trabalhadores e pode lançar tentativas para controlá-los, aumentando metas, diminuindo prazos, gerando sobrecarga e sofrimento psíquico”, avalia a psicóloga. Além disso, pessoas que trabalhavam juntas estão isoladas, o que também pode ser elemento de sofrimento ou sobrecarga.

Neste contexto, é muito importante considerar os aspectos da organização do trabalho, não apenas as questões do sujeito. “A gente pode tentar esse equilíbrio, buscar o que nos dê prazer e até não fazer exatamente nada, às vezes é preciso. Mas temos que ter margem de manobra. Só assim vamos conseguir esse equilíbrio. Os gestores precisam considerar isso quando elaboram as metas. Saúde mental é buscar esse equilíbrio”, defende Laura Nogueira.

O ergonomista José Marçal Jackson Filho, pesquisador da Fundacentro, segue a mesma linha da psicóloga ao destacar que as LER/Dort não se explicam apenas por condições fisiológicas. Em pessoas colocadas sob forte pressão, como no setor bancário, por exemplo, observam-se problemas muscoesqueléticos e de transtornos mentais.

“Com o teletrabalho, houve queixas porque as pessoas não tinham postos de trabalho preparados em casa. Mas não é só este o problema, que está atrelado a outras formas de cobrar o trabalho. Não foram só as pessoas que trabalham que tiveram que se adaptar, as famílias tiveram”, destaca o ergonomista.

Há casos de exigência de mais produção das pessoas por estarem em casa. Ao mesmo tempo, convive-se com a inexistência de um lugar específico para o trabalho no espaço doméstico e com situações de interrupção características da vida familiar. Outro fato que pode ocorrer é o aumento dos mecanismos de pressão imposto pela gestão das empresas e instituições. “Contrariamente à ideia implícita nos mecanismos de controle, na qual as pessoas não trabalham se não forem controladas, o que se observa na prática – tanto no setor público, quanto privado – é que os trabalhadores pouco comprometidos são a exceção. A gestão precisa, portanto, adotar outra perspectiva. Muitas empresas perceberam que o trabalho remoto aumenta a produtividade porque as pessoas estão envolvidas”, afirma Marçal.

Neste cenário, é preciso ir além de um referencial teórico metodológico como a ergonomia, que estuda o homem no trabalho, e observar as questões da vida que interferem nessas novas formas de trabalhar.

Já a médica do trabalho e ex-perita federal, Nadja Ferreira, ressalta a importância de se descobrir as causas da LER/Dort durante o diagnóstico. Outra questão é a extensão do horário de trabalho durante o teletrabalho, em que há uma mistura com o trabalho doméstico. “As LER/Dort  são de ordem multifatorial. Há o ambiente de trabalho, a carga psicológica. Tudo isso faz parte desse contexto”, completa a médica do trabalho e chefe do Centro Regional Sudeste II – Rio de Janeiro, Adriana Hilu.

O auditor-fiscal do Trabalho, Marcel Giuliano, por sua vez, explica como funciona uma fiscalização em ergonomia. Busca-se observar aspectos da NR 17 (Ergonomia), por exemplo, transporte de cargas, organização do trabalho, cadência, condições de trabalho e ruído, e da NR7 (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional ), como o controle periódico da saúde dos empregados e o instrumental epidemiológico. Por outro lado, há a questão da regulamentação do teletrabalho, pelo Art. 75 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, e as mudanças trazidas pela pandemia.

“Há uma limitação para verificar de forma efetiva o teletrabalho, mas entendemos que as empresas tiveram que alterar o contrato de trabalho, de presencial para o teletrabalho. Por virtude da pandemia, estamos focando na orientação dos empregadores, para que as empresas se adequem”, afirma Marcel.

(Fonte: Ministério da Saúde)