O segundo dia do seminário on-line da Lei nº 10.607/2019, que condiciona a aprovação de construção, reconstrução, ampliação e reforma e translado no município de Florianópolis-SC à inexistência do amianto, reuniu especialistas que discutiram a aplicabilidade dessa legislação.
O professor aposentado da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), atualmente docente voluntário e pesquisador do Departamento de Arquitetura e Urbanismo, Lino Fernando Bragança Peres, ressalta os itens da legislação que são necessários para liberação de qualquer obra.
É necessária a comprovação negativa da existência de quaisquer tipos de amianto ou asbestos no empreendimento. Sem essa certificação negativa, o alvará não é liberado para o projeto de construção. “A construtora e o responsável técnico da empresa precisam ter o termo de compromisso de substituição desses objetos até o fim da obra”, salienta. Completa que também é imprescindível ter uma placa de sinalização nas obras de construção civil, públicas ou privadas, constando o nome do Responsável Técnico e o seguinte texto: “Nesta obra não há utilização de amianto ou produto dele derivados, por serem prejudiciais à saúde”.
O arquiteto sugere que seja montada uma comissão de implementação da Lei, com a participação da Fundacentro, da Secretaria Municipal de Infraestrutura, Comcap – Autarquia de Melhoramentos da Capital e Secretaria da Saúde e do Meio Ambiente. Lino enfatiza que é preciso discutir o prazo de quatro anos a partir da vigência da legislação, que iniciou em setembro de 2019, em meio à pandemia, para substituição total dos materiais contendo amianto de suas edificações. “Com a pandemia, a lei já está defasada e precisamos fazer um ajuste”, explica.
O pesquisador encerra falando um pouco sobre aterros e responsabilidade na destinação de resíduos. “É de responsabilidade do Poder Executivo Municipal a ampla divulgação dos efeitos nocivos à saúde da população causados pelo amianto, assim como os resíduos gerados”, finaliza.
Dando continuidade, o engenheiro sanitarista e ambiental, Vinícius Ragghianti, do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Santa Catarina – Crea-SC, discorre que o órgão está orientando sobre a necessidade de responsabilidade técnica dos profissionais habilitados: engenheiro de segurança, ambiental e sanitarista que lidarão com a destinação final de resíduos. “Estamos dispostos a colaborar com a criação da Comissão sugerida pelo professor Lino. É importante envolver os profissionais da tecnologia, porque temos que fazer todo o processo de comunicar e sensibilizar os nossos profissionais de que isto está acontecendo”, salienta.
Ragghianti também destaca que os profissionais do sistema ficam preocupados com as leis que não se tornam efetivas. “Nós dependemos da legislação para fazer valer todos os aspectos de segurança e de proteção da sociedade. A engenharia acaba sofrendo pela clandestinidade das obras e, que, é um problema comum em Florianópolis”, frisa. A falta de aterros Classe 1 também foi apontada pelo engenheiro. “Fico preocupado com a questão da logística. Temos essa questão do Lixo Zero que é fundamental, e uma política de não usar mais os aterros. Mas ainda temos esses resíduos”, indaga.
O tecnologista e engenheiro florestal, Gustavo Pottker, da Fundacentro, informa sobre uma proposta de projeto que está sendo desenvolvido pela instituição e com apoio de outros órgãos, que visa gerar informação para facilitar a aplicação da lei nº 10.607/19, o qual trabalho consiste em mapear e classificar o uso de solo.
Gustavo salienta que será feito um mapeamento e classificação do uso de solo, para gerar um mapa que facilitará no planejamento e dimensionamento dos trabalhos de remoção do amianto nas instalações municipais. “Usaremos imagens de satélite de forma remota, que facilitarão na identificação de quais materiais são de fibras de amianto e os que não são”, explica Gustavo.
Saúde
“A palavra asbestos vem do grego que significa inextinguível, Imortal, Indestrutível, tais quais as doenças que os asbestos causam nos seres humanos que são progressivas, irreversível e mortal. A importância deste evento e de outros já estão mais que justificadas”, inicia a sua fala Edna Maria Niero, médica da Vigilância da Secretaria Municipal da Saúde de Santa Catarina. Em seguida, a médica informa que desde 1994, em Florianópolis, existem Serviços de Saúde do Trabalhador ligados à SMS.
“Em 2015, Florianópolis era sede de um Centro de Referência Regional em Saúde do Trabalhador, e recebemos uma demanda do Estado de Santa Catarina e do Ministério Público Federal, em cumprimento do artigo 5º da Lei Federal nº 9.055/1995”, comenta Edna. Completa que o foco do trabalho foi de realizar um levantamento das empresas de materiais de construção.
“Na época existiam em torno de 75 empresas. Todas elas foram contatadas e metade assumiu que vendia artefatos contendo amianto, especialmente caixa d’água e telha. Essas empresas foram notificadas com intimação da Vigilância Sanitária para cumprirem o artigo 5 da lei e o anexo 12 da norma regulamentadora nº 15.
Já Hermano Albuquerque Castro, médico pneumologista e pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz), comenta sobre o projeto Troca Limpa do Amianto realizado há alguns anos. “90% do amianto usado no Brasil foram para coberturas de caixas d’água, e esses artefatos eram instalados em casas da população de baixa renda”, informa.
O médico pneumologista acrescenta que o trabalho possibilitou a produção de um manual de capacitação de trabalhadores para a retirada e o descarte de telhas e caixas d’água.
O secretário adjunto da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Marcelo Bohrer, explica o trabalho de licenciamento e fiscalização das obras da cidade de Florianópolis. Além de outras questões que envolvem urbanismo e habitação social.
“A Secretaria acompanha a implementação dos novos empreendimentos para que não seja feita nenhuma construção utilizando amianto. Nas reformas que, porventura possam conter, é imprescindível que sejam retirados de forma responsável todo e qualquer material que exista dentro daquela construção”, frisa Marcelo. Destaca de forma pioneira a questão do uso do termo de responsabilidade técnica. “A própria lei diz que a responsabilidade da retirada e destinação dos resíduos, até 100 metros quadrados, é da Comcap. Obras com mais de 100m², o proprietário é responsável”, comenta Bohrer.
O secretário informa que, através de outros convênios com o Crea-SC e o Sinduscon-SC, pretendem agendar mais reuniões técnicas para implementar a colocação de placas nas obras. “As obras adequadas, de acordo com a lei nº 10.607/19, precisam sinalizar que não usam nenhum material contendo amianto”, frisa.
Remoção do Amianto
“Até hoje, discutimos a questão do banimento da produção de materiais contendo amianto no Brasil. Mas a indústria do amianto luta para continuar exportando, principalmente, para a sociedade mais vulnerável do que a nossa”, esta é a fala da auditora-fiscal do trabalho aposentada e coordenadora da Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto para a América Latina, Fernanda Giannasi.
“Cumprimento Florianópolis por trazer a primeira lei que aprofunda e trata da remoção do amianto. É fundamental que trabalhemos agora para que tanto o material produzido pela Fundacentro, como o trabalho feito pela Fiocruz, possa se tornar uma norma técnica do Brasil, e seja seguido como é feito em outros países”, declara Fernanda.
“O Brasil foi o terceiro maior produtor e exportador, e o quarto maior consumidor ainda não temos um diagnóstico da situação dos trabalhadores e da sociedade em geral”, reforça Giannasi.
Além da crisotila (encontrada na maior parte dos materiais de construção), Fernanda coloca em sua fala a preocupação em relação ao crocidolita (amianto azul) que foi importado pelo país, principalmente para as tubulações de cimento amianto. “Embora tenha parado de utilizar a tubulação de cimento amianto em 1990, a maior parte das cidades do Brasil, a água potável e esgoto são constituídos por esse material”, ressalta a auditora-fiscal aposentada. A palestra completa de Fernanda Giannasi e os debates no final deste bloco com a participação do secretário Marcelo Bohrer podem ser conferidos no Canal da Fundacentro no YouTube.
Também esteve presente como mediador, o tecnologista José Renato Schmidt e para finalizar a tecnologista Valéria Ramos Soares Pinto, ambos da Fundacentro. Ao final de cada bloco, os especialistas responderam perguntas dos internautas e aprofundaram as discussões dos temas abordados.